sexta-feira, dezembro 11, 2009

De Marshon Para Mauld - III

.

Dum quarto alugado, 12 de Março de 1925

Minha insubstituível Mauld,

Mal cheguei e já tenho notícias. Consegui vender quatro das pinturas que trouxe e aluguei um pequeno quarto em Sevran. Foi rápido, pensei que teria que pedir abrigo no Ivan. O lugar é escuro, úmido e creio estar infestado de percevejos, mas amanhã procuro algo melhor.
Vou tomar uma dose enquanto penso em algo interessante; para não mandar só um bilhete.
Pensei em algo que acho que nunca te disse sobre sexo:
Acho uma das melhores coisas da vida. E isso é tão forte que as vezes não intendo não gostarem. É fisico. É como comer. Comer é físico e te dá satisfação física completa quando você come uma comida realmente deliciosa. É uma satisfacão que todo mundo admite: "comer é das melhores coisas da vida". É como sentir um perfume delicioso, hipnotizante, desses que você se entrega para farejar como um animal, encantado. É físico. Seja um perfume exótico ou um cheiro de comida; um único sentido encontra-se totalmente em estado de alerta e isso causa prazer imenso ao espalhar-se pelo sistema corpóreo. Como uma música que vai além dos ouvidos e entra pela corpo, que te movimenta como por cordas místicas invisíveis. Um som que te movimenta por ele mesmo, que a mente desliga todos os outros sentidos porque não são mais que ruidos para o momento em que precisa se focar somente nesse som. É físico. É delicioso. É quase ideológico! Uma ideologia do cérebro: Siga o som. Você entra em transe. É como ver o belo e viajar em sua harmonia ou na deliciosa falta dela. Quando próximos ao belo absoluto apenas a visão se ativa e se foca no que a encanta assumindo o controle do corpo. As imagens ficam nítidas, seja as que entram pelos olhos ou as que se formam no mundo de construções visuais internas. Tudo é silêncio e você é apenas visão. É físico. É o que procuro causar. É como um urro, um grito de dor ou choro. Como um gemido profundo. É expulsão de força. É aliviante. É físico como todos os outros focos do corpo para criar prazer. É assim tão físico o prazer do sexo. Assim como a comida deliciosa tem seu contexto de feitura e ato alimentício, o sexo tem seu contexto no 'com quem', mas não por isso o foco principal deixa de ser físico e, por isso, pessoal e intransferível.
Como no perfume, no som, no sabor, no grito, existe o momento do clímax, de total foco e desconexão. Assim no sexo o clímax deve ser em várias doses, nas várias etapas do desenvolvimento do ato. Nos toques. O sexo é o clímax do tato. O corpo inteiro vira tato em várias ondas de sensações únicas e os corpos, não pensantes, trocando informações puramente táteis que se harmonizam em movimentos, naturalmente, simbioticamente sem esforço, porque não poderia ser diferente. Como o corpo e o perfume, o corpo e a música, o corpo e o sabor, o corpo e o grito. Quando ultrapassa o limite do órgão sensorial e a percepção é corpo, esse é o clímax. No sexo somos o tato-vivo. Uma sensação-viva. Sexo é no corpo todo. Sexo é físico e maravilhoso. É conjunto e é solo. Paladar, olfato, audição,visão, voz e Tato.
Creio que agora alonguei demais a carta. Mande notícias da trupe. Espero voltar rico de Paris.

Deverias estar aqui para conhecermos o Moulin Rouge,
Seu melhor amigo pintor

J. Marshon

PS: Não fiz aquele pedido que me pediu porque não atirei tua moeda na fonte mágica. Precisei comprar cigarros e não trouxe trocados comigo. Se funcionar para ti, atiro moeda minha quando trocar o dinheiro.

.

Nenhum comentário: